Telemarketing.

Para: Omega Assist – Plano Funeral

Assunto: Ligações indesejadas

Caros,

Quem é o responsável pela divulgação e propaganda do serviço de vocês? Contratem uma consultoria comigo, pois eu teria muito a contribuir e enriquecer no que diz respeito ao relacionamento com o cliente. Acho que eu seria valiosa para a empresa. Aproveitem que estão me ligando insistentemente e marquem um café comigo para conversar. A empresa deve parar com esse procedimento de ligar dia e noite para as pessoas. É de péssimo tino empreendedor adotar esta “estratégia” para abordar um possível cliente

Atenciosamente,
Futura funcionária da empresa.

Como começar o ano.

A Suave Arte Sueca da Limpeza da Morte, o minimalismo, a tradição do clutter clearing.

Novas tendências estão nos dizendo para reduzir o número de coisas que nós possuímos e para fazermos uma limpeza profunda na parte material da nossa vida (que sem dúvida tem impactos emocionais).

Radicalismos a parte, eu gosto de dar aquela limpeza geral e profunda na casa no início do ano. Janeiro e fevereiro são meses bastante estratégicos para realizar este tipo de faxina (eu geralmente realizo mais uma ou duas no ano, dependendo do meu estado de espírito e de quão turbulento estiver sendo o ano).

Como eu disse, esta tendência de limpar o ambiente e reduzir o número de pertences está na moda. Quem já experimentou vai provavelmente concordar comigo que dar essa atualizada nos seus pertences é super catártico e útil: você se livra do que está apenas ocupando espaço, você tem a oportunidade de doar peças de roupa ou pertences dos quais você pode abrir mão, e você ainda redescobre tesouros perdidos no fundo do armário.

Se essa limpeza se tornar um hábito em sua vida, você vai perceber que ela se tornará cada vez mais rápida e fácil de realizar. Quando isso acontecer, você já terá alcançado aquilo que é central em sua vida.

Nas primeiras vezes que eu fiz essa varredura completa em minha vida, não era nem sequer possível realizar essa tarefa em um só dia. Com o passar do tempo, o processo já era bem mais rápido, mas não menos significativo e gratificante.

Como há dez anos atrás, quando eu comecei a utilizar essa técnica de organização pessoal, esse assunto ainda não era muito comentado, eu cometi alguns erros. Eu comecei a vasculhar os meus pertences e me livras dos excessos quando eu já estava me sentindo completamente sufocada pelo acúmulo da tralha. Então eu fazia essa faxina com raiva. Eu acabei jogando muitas coisas fora que eu me arrependi de ter jogado. Cartas de ex-namorados, lembranças de eventos bobos com os amigos, agendas antigas, certas peças de roupa que tinham valor sentimental.

Eu teria guardado essas coisas, com moderação, mas teria guardado. Hoje em dia eu preservo esse tipo de pertence. Eu tenho uma caixa para roupas especiais, um scrapbook para cartas dos amigos, ingressos de cinema etc.

Você não precisa se desfazer de todo o seu passado. É importante manter aquilo que é especial para você. Caso você esteja na dúvida de algum item, mantenha-o entre os seus pertences e reavalie a necessidade de guardá-lo no próximo ano.

O importante é se livrar dos excessos.

Eu também já não sinto raiva durante o processo. Muito pelo contrário. Como eu disse, naquela época esse assunto não era muito debatido. No início eu sofria com o acúmulo de pertences e não tinha método para me livrar deles. Fui aprendendo aos poucos a diferenciar o que eu deveria guardar e o que era excesso. Também fui aprendendo aos poucos a valorizar mais os aspectos positivos do processo do que os negativos. Sim. Dá trabalho. Mas vale a pena.

Vale a pena experimentar.

E lembre-se, o objetivo é reduzir o número de pertences. Então não estamos falando de liberar um espaço para logo preenche-lo com mais um monte de bobagens. É para liberas um espaço que vai trazer mais e melhor circulação para sua vida (de energia, bons pensamentos, do seu olhar pela casa, ou mesmo apenas facilitar a manutenção da casa).

É claro que a bagunça diz algo sobre nós. Portanto, não apresse esse processo, principalmente se for a primeira vez que você vai coloca-lo em prática. Tenha o cuidado, principalmente, de tomar um tempo para entrar em contato com as suas experiências passadas a partir de seus pertences.

Cinco palavras sem sentido.

Eu já fiz um exercício numa oficina de escrita criativa que com sistema no seguinte: cinco pessoas da turma falavam cada um uma palavra e todos os participantes tinham que escrever uma narrativa que contivesse todas as cinco palavras sem variações. Por exemplo, se a palavra era sangue, tinha que usar sangue mesmo, não poderia ser sanguinolento.
Há um tempo eu vi uma cena no trem sobre a qual eu queria escrever, mas até hoje eu não sei como fazer esse texto.
Seguindo o procedimento proposto na oficina, trata-se de um texto que tem que conter as cinco palavras a seguir:

Hidrocefalia.
Cego.
Chokito.
Prestígio.
Latão.

 

Eu peguei o trem no meio da tarde para ir até o Engenho de Dentro visitar uma amiga. O vagão não estava lotado, mas não tinha lugar para sentar. Fiquei em pé perto da passagem de um vagão para o outro. Eram vagões assim como aqueles mais novos do metrô, que permitem que você passe de um vagão para outro através de uma estrutura de ligação sanfonada.

Logo assim que eu abri um livro para ler, um homem com uma menina em uma cadeira de rodas pararam bem na minha frente. O homem começou a falar com os passageiros:

– Senhoras e senhores, muito boa tarde! Desculpem interromper a viagem de vocês, mas eu venho aqui, com toda humildade, apelar para o coração de vocês. Se for possível, senhoras e senhores, fazer uma caridade… Esta é minha filha, senhoras e senhores. Ela nasceu com microcefalia, ela não anda, ela não consegue se alimentar ou ir ao banheiro sozinha. A mãe dela nos abandonou alguns anos atrás e eu, infelizmente, não posso trabalhar, senhoras e senhores, pois tenho que cuidar da minha filha, senhoras e senhores. A cabecinha dela, senhoras e senhores, acumula líquido e este líquido tem que ser drenado de duas a três vezes por dia, se não ela pode vir a falecer, senhoras e senhores. E só tem eu para fazer isso com ela. Ela não estuda, ela não fala, ela não tem como viver sem o meu auxílio, senhoras e senhores, e para poder ajuda-la, eu preciso da colaboração de vocês.

A essa altura, o homem já começou a ir andando vagarosamente pelo vagão recolhendo dinheiro. E outra voz começou a ganhar destaque.

– Muito obrigada pela compreensão e colaboração, senhoras e senhores. Que Deus abençoe o coração de vocês.

Era um homem cego idoso que vinha se aproximando da passagem que dava acesso ao meu vagão. Este home cego parou na minha frente e começou a falar.

– Muito boa tarde, senhoras e senhores. O cego vem pedir uma ajuda, pois eu não consigo arrumar emprego e tenho família para sustentar.

Mas nessa hora veio se aproximando novamente o homem com a filha na cadeira de rodas. Ele passou pelo homem cego e ficou a um metro dele, de costas, virado para os passageiros do vagão de onde o homem cego tinha vindo e ele reiniciou o seu discurso.

– Senhoras e senhores, muito boa tarde! Desculpem interromper a viagem de vocês, mas eu venho aqui, com toda humildade, apelar para o coração de vocês. Se for possível, senhoras e senhores, fazer uma caridade… Esta é minha filha, senhoras e senhores. Ela nasceu com microcefalia – a voz do cego se misturava com a dele – e foi assim que eu perdi a visão, senhoras e senhores. E se Deus me tirou a visão eu sei que foi na sabedoria dele e eu só peço que vocês me ajudem com qualquer moedinha – A cabecinha dela, senhoras e senhores, acumula líquido e este líquido tem que ser drenado de duas a três vezes por dia, se não ela pode vir a falecer – E eu entrei sim para as drogas. Eu não tenho vergonha de admitir. Por isso eu sei que Deus, em sua infinita sabedoria, tirou a minha visão. Então, eu já fui punido, senhoras e senhores. – Ela não estuda, ela não fala – Eu não enxergo e conto com a compaixão de vocês.

– Latão! Olha o latão! – Mais um sujeito passa por mim gritando. – Latão cinco reais! Latão para refrescar a sua viagem e começar a sua sexta feira!

– Então, quem puder colaborar, senhoras e senhoras, para evitar que essa criança maravilhosa venha acabe por aí morta, senhoras e senhores, qualquer ajuda eu agradeço.

– Pode colocar o dinheiro aqui no chapéu do cego.

– Ééééééééé… ochokitoprestígiobalahalls a um real… Ééééééééé… ochokitoprestígiobalahalls a um real…

– Ééééééééé… o chapéu do cego para evitar que essa criança maravilhosa a um real para refrescar a sua viagem.

Eu não pude ajudar ninguém. Eu tinha apenas cinquenta reais inteiros, virei as costas na minha estação e saí do trem.

FIM.

 

Ruim, não é? A história? Eu demorei a escrever por esse motivo. Essa história não tem moral, não tem fechamento, não tem epifania. Ela consiste em um monte de palavras aleatórias, absurdas, que jamais apareceriam juntas em uma história se não fosse a vida humana uma loucura.

Saudades. 

Se fosse hoje meu primeiro dia a falhar no Blog eu não ligaria.
Seria, inclusive, perfeitamente compreensível.
Mas uma noite dessas. Atormentada, com você longe.
Quantas dessas mais virão?
Todas as noites que teremos nessa vida já serão poucas. Me desculpe pela melancolia, mas você sabe que eu penso assim.
Você sabe que eu queria que nós fôssemos grudados. Blá-blá-blá, não me vem reclamar de falta de autonomia e dependência. Eu sei que na hora de dizer: “Tchau. Eu te amo. A gente logo se vê de novo”, o seu coração aperta tanto quanto o meu.
Eu fico aqui vegetando…
O problema é que seja um evento grande o suficiente para ter que se despedir, sabe? Não gosto de me despedir de você.
Alguma coisa é sempre muito esquisita para mim quando a gente se despede.
Quando a gente está perto tudo se encaixa. Se a gente está bem ou se a gente está brigando, não importa; eu sempre sinto que está tudo bem e que a minha vida está seguindo no caminho certo: compartilhar experiências com você.
Você sabe que eu comecei a sentir saudades dois dias antes de você ir. Então, se diverte, mas volta logo. Eu estou esperando você.

“De que modo são as bruxas transportadas de um lugar a outro “.

Por que lembrar de eventos há tanto transcorridos?
Por que mergulhar no passado uma vez e outra ainda e mais outra?

“Eis, enfim, o seu método de transporte pelo ar. De posse da pomada voadora, que, como dissemos, tem sua fórmula definida pelas instruções do diabo e é feita dos membros das crianças, sobretudo daquelas mortas antes do batismo, ungem com ela uma cadeira ou um cabo de vassoura; depois do que são imediatamente elevadas aos ares, de dia ou de noite, na visibilidade ou, se desejarem, na invisibilidade (…); noutras ocasiões, mesmo sem qualquer auxílio exterior, elas são visivelmente transportadas exclusivamente pela força dos demônios” (p. 228).
“Contamos aqui o caso de um vôo invisível, feito à luz do dia. Na cidade de Waldshut, às margens do Reno, na diocese de Costance, havia uma certa bruxa tão detestada pelos habitantes da cidade que não a convidaram para a celebração de um casamento, ao qual, no entanto, esperava-se o comparecimento de todos os moradores da região. Indignada e desejosa de vingança, chamou a sua presença um demônio. Tendo lhe explicado o motivo de seu aborrecimento, pediu-lhe que desencadeasse uma tempestade de granizo para dispersar todos os convidados da festa; o demônio concordou e, elevando-a no ar, levou-a até uma colina, nas proximidades da cidade, à vista de alguns pastores. Pôis-se então a cavar um pequeno foço que deveria encher de água para poder desencadear a tempestade (pois que é esse o método que usam para provocar chuvas de pedra). Como ali não dispusesse de água, encheu o foço com a própria urina e começou a revouvê-la com o dedo – conforme manda o ritual –, com o demônio a pastos a observá-la. Então, repentinamente, o demônio fez todo o líquido subir pelos ares, desabando uma violenta chuva de pedras apenas sobre os convidados e os dançarinos da festa. Depois de terem se dispersado e ficarem a se perguntar qual teria sido a causa do temporal, viram que chegava a bruxa na cidade, o que levantou forte suspeita sobre ela. No entanto, depois que os pastores contaram o que viram, a sua suspeita transformou-se em certeza, pelo que a mulher foi presa. E confessou que assim procedera porque não fora convidada para o casamento. E, por esse motivo, e pelas muitas outras bruxarias que já perpetrara, acabou queimada na fogueira”.
“E como a história do vôo das bruxas é fato cada vez mais comentado e público, mesmo entre as pessoas comuns, é desnecessário aqui aditar outras provas. Esperamos que esses exemplos sejam suficientes para esclarecer os que ainda negam a existência desse fenômeno, ou os que tentam sustentar que são fenômenos meramente imaginários ou fantásticos” (p. 229).
“De fato, teria pouca importância deixar esses homens incorrerem nesse erro, não fosse a sua crença tão danosa à Fé. Pois que, não contentes em sustentar o erro, ainda persistem em sustentar e publicar muitos outros que contribuem para o aumento do número de bruxas e para o detrimento da Fé. Porque afirmam que toda a bruxaria só pode ser atribuída à imaginação e à ilusão de alguns homens, como se se tratasse de algo inócuo, tão inócuo quanto o seu vôo, mera fantasia” (grifo meu, p. 229).

Sabem tudo aquilo que te falaram para que você não julgasse os fatos do passado com os olhos atuais? Devemos perdoar os homens do passado, pois eles não sabiam o que estavam fazendo? Eu já havia falado sobre essa ideia em um texto bastante antigo do blog. Repito. Não temos que perdoar os homens do passado. Temos que repudiar suas ações e nunca mais repetir seus erros. Encontrei no próprio Martelo das Feiticeiras, livro publicado em 1484, o argumento que me permite condená-los por seus atos sem desculpá-los por motivo algum. Na passagem destacada acima fica absolutamente evidente o fato de que, já naquela época, havia pessoas apontando para o absurdo que era acreditar em bruxaria. O que aconteceu foi que, infelizmente, aqueles que estavam certos perderam na disputa pelo poder e tiveram seu discurso suplantado pelo fanatismo.
Já naquela época havia trabalhos sendo publicados que falavam sobre o absurdo que era creditar em bruxaria, que afirmavam que tudo não passava de uma fantasia. Então, os elementos necessários para combater o obscurantismo da fé e acabar com toda a abominação que foi a Inquisição estavam dados.
Você me pergunta qual é o sentido de ficar revirando o passado? Porque estamos sempre a um movimento social em falso de uma nova barbárie. Além das muitas das quais ainda somos vítimas.
Por acaso vamos querer que o futuro nos perdoe por massacrar nossos jovens negros nas favelas? Por culpar as mulheres vítimas de violência pela violência que sofrem? Qual é a nossa desculpa?
O nosso erro é pensar que o passado foi completamente superado. A gente assiste séries e filmes sobre a forma como o tempo é circular e não linear (A Chegada e Dark, por exemplo), e não se dá conta de que esse fenômeno é verídico; mais uma vez, a ficção conta verdades falando mentiras.
O passado se repete, e repete, e repete. E se essas citações não te assombram como a mim, é sinal de que temos de lembrar estas histórias horrendas mais e mais.

KRAMER e SPRENGER, O Martelo das Feiticeiras. Tradução de Paulo Fróes. 13a edição. Rio de Janeiro: Editora Rosa dos Tempos, 1998.

Déjà vu.

Nós temos a certeza de que a morte é o fim da nossa vida atual.
Isso não quer dizer que a morte é necessariamente o fim de tudo.
Há aqueles que acreditam na vida eterna, os que acreditam em reencarnação etc. Mas eu ainda não conheci nenhuma religião que diz que você, depois de morrer, pode escolher retomar sua vida do ponto onde parou e seguir como se nada tivesse acontecido (ou seja, escolher ressuscitar) ou, segunda opção, escolher ficar morto mesmo.
Seria assim: você morre e imediatamente se vê diante de um ente sobrenatural que te pergunta: “e aí? Vai ser dessa vez ou não”?
Aí você pensa, pensa… Lembra daquele curso que você não terminou de fazer… Daquela pessoa que está ficando para trás… E aí? Fico ou volto?
E você resolve voltar. Neste momento a sua memória é apagada, logo antes de você ser mandado de volta apenas com o gatilho necessário para não repetir a cagada que aconteceu antes.
Mas esse gap de tempo em que você ficou morto cria uma pequena distorção na realidade, que nós conhecemos como o fenômeno do já visto ou Déjà vu.
E quando a gente morre e volta, rebubina-se a fita um pouco (para que a gente não acabe morto novamente), para o ponto em que você ainda pode mudar o curso dos eventos, não disparando a cadeia de ações e acontecimentos que levaram até a sua morte. Com essa rebubinada, você pega um milissegundinho do que você já viveu e esse fenômeno se faz perceptível para que haja a tal interferência no rumo das suas ações: nesse momento você tem um Déjà vu. Ele geralmente quebra o ritmo dos acontecimentos momentaneamente. É desse gatilho que falamos acima. É aí que você muda o seu rumo.
Eu tive um Déjà vu hoje durante uma aula. No momento, eu estava decidindo se saía mais cedo ou não. Depois do Déjà vu eu pensei nessa teoria (na verdade, eu lembrei, pois era isso que eu pensava sobre o fenômeno na adolescência). Resolvi, então, fazer o contrário do que eu estava inclinada a fazer: fiquei até o final da aula.
Se a minha teoria sobre o Déjà vu estiver correta, eu já havia tomado a decisão de sair mais cedo e uma tragédia já teria acontecido. Eu teria morrido, mas resolvido voltar.
Voltei para o ponto em que eu estava tomando a decisão que acarretaria a tragédia e tomei uma decisão diferente.
Por que, então, se é possível escolher voltar, as pessoas acabam morrendo de modo mais permanente a certa altura de suas vidas? Eu imagino que tenha um número limitado de vezes que uma pessoa pode escolher voltar. E outra possibilidade, pode ser que nesse momento de escolher voltar ou não, a pessoa fique encantada com as maravilhas do outro mundo e resolva ficar pelo lado de lá mesmo. Então, tem essas duas explicações para a saída desta vida.
Tem também o problema do que acontece com a vida das outras pessoas quando se rebubinada o tempo. Bom, eu imagino a existência temporal e espacial como uma grande colcha tecida a mão. Se dá um problema em um pedaço, você desfaz aquele pedaço que deu defeito, você não precisa refazer o serviço inteiro. Na pior das hipóteses, você desfaz a colcha até chegar no pedaço que você quer consertar e depois continua.

Gratidão.

A palavra gratidão está na moda.
Resisti de início e fiquei desconfiada do uso que estava se fazendo dela.
Pensei um bocado a respeito.
Gratidão… O sentimento de ser grato. Mas por alguma coisa ou por alguém?
As pessoas têm se sentido gratas por tudo ultimamente: suas características pessoais, suas habilidades, seus bens materiais, suas oportunidades de trabalho, pelo sol e a natureza, pela comida de cada dia, pelas pessoas ao seu redor.
Não quero fazer nenhum tipo de julgamento de valor sobre esses sentimentos. Quem sou eu no fim das contas!?
A única coisa que me cabe dizer é que eu percebi que para mim faz sentido o sentimento de gratidão em relação às pessoas e à presença delas em minha vida ou à marca que deixaram.
Não que as outras coisas não sejam importantes, algumas delas são absolutamente fundamentais. Mas, para mim, não caberia em relação a elas o sentimento de gratidão.
Em relação ao sol e a natureza eu sinto um sentimento de reverência; em relação à comida eu sinto necessidade biológica (e alguns problemas emocionais); em relação a oportunidades de emprego e bens materiais eu sinto admiração para conigo mesma, um sentimento de realização, por eu ter me dedicado para alcançar meus objetivos e um pouco de alívio e segurança.
Enfim, gratidão mesmo nomeia o que eu sinto em relação ao contato humano.
As pessoas ficam na nossa vida porque elas querem estar junto de nós. E por isso nós só podemos ser gratos. Certas marcas que as pessoas deixam em nossas vidas, sejam elas felizes ou dolorosas fazem parte da nossa jornada e nenhum trabalho, bem material, nenhum prato de comida nem mesmo o sol conseguirá se equiparar em significação e importância. O contato humano possui sempre um sentido transcendente no nosso caminho.
Então, eu decidi aproveitar a palavra da moda para expressar meu sentimento de gratidão em relação a algumaa pessoas especiais que fazem ou fizeram parte da minha vida.
Por que a gente deixou de enviar cartas com declarações de amor para os amigos depois da quinta série, no fim das contas? Esse é um hábito que nunca deveríamos ter abandonado.

Juliana.

Você foi uma das pessoas que mais me surpreendeu nessa vida.
Eu tenho orgulho de falar de como você é foda atualmente.
A sua história, para mim, é uma grande fonte de inspiração. Eu vejo como você lutou contra muitas questões que eram difíceis de lidar e se tornou uma nova e maravilhosa pessoa.
É difícil escrever sobre as pessoas que mais amamos. Todo relacionamento tem momentos altos e baixos. Você não pode deixar os baixos de fora, mas também não pode deixar que eles se sobreponham aos bons momentos.
Nossa amizade certamente teve seus baixos. E uma coisa muito boa é que, hoje em dia, eu percebo que não só nós aprendemos muito com os problemas que tivemos, mas conseguimos transformá-las em piadas e rir muito das nossas idiotices.
Você é uma das pessoas com quem eu me sinto mais à vontade. A nossa amizade é simples e direta.
Mesmo longe pacas você está sempre muito presente.
Já falei que nossas conversas não são várias conversas diferentes, cada uma com começo, meio e fim; eu sinto que a minha vida é em parte um grande diálogo com você que está sempre em aberto.
Eu sei que eu já te fiz sofrer no passado e que eu ainda não sou a amiga perfeita. Estou muito longe disso, mas certamente me esforço e vou continuar me esforçando para ser a melhor amiga que eu posso ser.
Eu vivi com você alguns dos momentos mais engraçados da minha vida e as melhores partidas de RPG. Você sempre fica de graça, falando que isso e aquilo e que me dava trabalho narrar para você, mas você ignora o quanto era legal para mim. Qualquer aventura que eu criava você amava e isso me fazia me sentir muito bem. Ver a empolgação do jogador é sempre a maior motivação do mestre.
E a gente vai continuar tentando montar um grupo de RPG até morrer. Quem sabe um dia morarmos perto de novo uma da outra. Nem que seja no Canadá, na Austrália ou na Irlanda.
Acho nossa vida juntas muito bonita.
Obrigada por ser minha amiga.