Natalia.

Escrever a sua carta de gratidão não foi fácil.
Cara, tenho coisas maravilhosas e terríveis para falar da nossa amizade.
A gente viveu muita coisa.
Você foi, em alguns dos momentos mais difíceis que eu vivi, um arco-íris de alegria e esperança. Uma coisa que eu sei a seu respeito é que você é muito mais forte do que a sua aparência de fada delicada transparece. Por dentro você é o incrível Hulk e o Thor juntos. Desespero total assolando as tormentas da minha alma (e da sua também, por que eu sei que você sofre), e você resplandecendo a luz do foda-se de uma maneira que eu nunca vi em mais ninguém. Você me deu muita força para seguir em frente ao longo dessa vida e eu sou grata a você por isso.
As pessoas ficam se perguntando e elas também perguntam umas às outras se existem almas gêmeas. Sabe o que eu acho? A galera esquece que gêmeos não vêem apenas em pares. A minha alma tem algumas irmãs gêmeas e a sua alma é uma dessas irmãs.
Nós passamos sim muito tempo afastadas mergulhadas nos afazeres cotidianos que nos roubaram o tempo de um café mais de uma vez, mas a amizade que eu sinto por você já transcendeu o tempo e o espaço. Ela só se torna mais forte com o passar do tempo.
Acho, inclusive, que foi o universo que plantou em nossos corações o desejo de viver da arte para nos aproximar e nos possibilitar o imenso prazer de podermos trabalhar juntas. Eu nem acreditei que a gente já vendeu livros, nossos livros, que nós escrevemos, lado a lado.
E nessa jornada de artista, eu passei a te admirar ainda mais. Você é incrível e eu aprendo com você até hoje.
Não. Eu não estou satisfeita. Eu quero mais a sua presença física na minha vida. Mas, é importante que você saiba, na minha mente você está sempre presente.

Em 21 horas, a foto dos pés da Beyoncé recebeu 900 mil curtidas no Instagram.

Eu não sei se este deveria ser um texto de recomendação do creme que a Beyoncé usa nos pés… Não sei se deveria ser um texto sobre o fato de que o corretor automático do meu celular conhece a palavra “Beyoncé” mesmo que eu só tenha digitado pouquíssimas vezes, se deveria ser sobre o fenômeno da fama ou sobre as características divinas da diva.
Só sei que o número de curtidas que a foto dos pés dela receberam me embasbacaram.
Há poucas semanas comecei a seguir a Beyoncé no Instagram. Gosto dos hits dela (fala sério, são maravilhosos) fora isso não sei muito da história de vida ou da carreira dela, nem nunca tive uma conversa profunda com ela sobre os principais dilemas filosóficos que assolam a humanidade. Mas, quando eu vi a foto dos pés, curti.
Admirei-me logo em seguida.
O fato é: às vezes eu não curto coisas de pessoa eu conheço pessoalmente, com quem eu já tomei café na padaria; isso por pura preguiça ou falta de tempo ou tédio. Mas os pés da Beyoncé…. Aí eu curto no automático.
Então, acho que nem se trata de admirá-la ou não, gostar dela ou não (se eu tivesse que me manifestar nesse sentido, eu até diria que gosto bastante dela, mulher e poderosa o que tem para não gostar?). Esse não é o ponto. O ponto é que eu acho que eu curti por conta da quantidade de curtidas que já haviam sido dadas. Fui tomada pelo comportamento de manada. Vontade de unir a minha curtida à dos outros milhares de fãs que curtiram a foto (que serão milhões provavelmente em mais algumas horas).
Depois que me dei conta da situação, eu voltei e curti todas as fotos de conhecidos. Não sei se vou fazer isso para sempre, curtir tudo que meus amigos postam, mas eu certamente vou ser mais criteriosa na hora de curtir as fotos das celebridades.
Se eu tivesse achado o sapato bonito pelo menos… Claro que a pele dela estava maravilhosa… Mas justifica? Se fosse uma foto criativa dos pés. Mas a foto não tinha nenhuma característica excepcional (além de estar de lado, parecia torta apenas).
A foto não era representativa dos dons artísticos da Beyoncé. A foto era a prova de que ela não precisa se esforçar muito mais para ficar no topo e, aparentemente, ela teria que fazer uma merda muito grande para sair desse lugar.
No caso da Beyoncé, eu nem fico com raiva, pois, como eu disse, acho ela foda. Mas isso me abriu os olhos para o fato de que isso é bastante comum. Um artista se consagra e depois não precisa fazer muito mais para se manter no topo (eu só ouvi uma música do Ed Sheeran até hoje, por exemplo, e o cara está bombando).
O que é, então, que faz um artista atualmente? O que é ser um artista? Gravar um hit? Ter dinheiro para pagar alguém para escrever um hit para você gravar? Ter dinheiro para pagar alguém para escrever um hit para você e alguém para te ajudar no playback e ficar lá no palco sendo bonita? Escrever uma grande obra? Ter muitos seguidores? Muitas curtidas? Muitos likes orgânicos? Continuar produzindo e expulsando o que está dentro de você a qualquer custo mesmo que seja para um público fictício?
Eu não preciso verdadeiramente de uma resposta nesse momento. Mas é estranho ter que fazer essas perguntas.

“Com amor, Van Gogh”.

Eu tenho estado na vibe das indicações e das resenhas ultimamente.

E eu reprimi por muito tempo o desejo de escrever resenhas e de indicar filmes e livros.
Além de ter um gosto meio estranho, algumas vezes estou sensível demais, outras cética demais, tem fases ainda que eu só quero ver comédia… enfim, eu também achava que era necessário ter algum conhecimento mais rebuscado sobre artes. Mas dane-se isso.
Hoje assisti “Com amor, Van Gogh”.
O filme é lindo.
Segundo o que dizem os créditos de abertura, este é o primeiro filme feito inteiramente com pintura a óleo sobre tela. Foram mais de 100 artistas que participaram da confecção de mais de 55 mil quadros.
Os traços e as cores utilizadas pelos artistas foram baseadas na obra Van Gogh.
Não é só por isso que o filme é sensacional, contudo.
A história é bem legal. Quase um thriller que conta a história do filho de um carteiro, amigo de Van Gogh, que tenta entregar a última carta que o pintor escreveu para o irmão, mas essa acaba não sendo uma tarefa fácil e, no caminho, o rapaz começa quase que por acaso a investigar o suicídio do artista.
O que verdadeiramente aconteceu com o pai da arte moderna?
O filme acerta na hora de passar uma visão de mundo sensível através da retratação de algumas cenas da vida do pintor e das falas dos personagens que são entrevistados sobre sua morte.
Ainda mais um mérito do filme, foi ter me apresentado uma música maravilhosa durante os créditos finais. Eu não a conhecia, mas minha mãe afirmou ser bastante antiga: Starry, Starry Night. Canção de Don McLean.
Você já vai chorar ouvindo a música.

Se eu soubesse pintar não teria escrito este texto.

Esse já é o quarto texto que eu começo a escrever hoje e nenhum dos anteriores me deixou satisfeita.

Cheguei em casa com uma forte vontade de pintar. Coloquei uma música no computador, peguei o meu material de pintura e pintei.

O problema é que eu pinto muito mal e fiquei muito frustrada. Desde que comecei a escrever, minha veia artística vem pressionando para desabrochar, mas eu não sei fazer nada além de escrever mesmo. O que eu queria era ter postado a minha pintura hoje. Mas eu não vou tirar foto desse negócio aqui para postar. Está feio demais. Eu não consegui pintar o que eu queria. Isso é muito desapontante. Quando se trata de um texto, eu vou escolher as palavras, o formato do texto, a pontuação e vou passar a minha voz para a narrativa (ou, pelo menos, eu consigo trabalhar com esse material e ver um resultado que, de alguma forma, me carrega junto). Com as tintas e o papel e os pincéis eu simplesmente não sei lidar. Ainda. Quem sabe no futuro…

Uma saída meio doida que me ocorreu é descrever a pintura que eu gostaria de ter pintado. Vamos a ela, por mais psicodélico que isso possa ser:

 

<<<Uma linha marrom nasce na ponta inferior esquerda de uma tela, fina e débil. Ela se sente insegura e chora a todo momento. Tem muito colo disponível. Ela se refestela. Conforme Marron avança em direção ao centro do quadro, ela se adensa e se torna cada vez mais amarela. Amarela de medo, amarela de dor de barriga, amarela por causa do brilho do sol, amarela por causa das flores que tem no cabelo. No ponto em que o marrom já não comparece e Amarelo domina a cena em um traçado grosso, mas leve e suave, diversos outros veios coloridos começam a despontar, desviando-se do caminho principal. Os frágeis tracinhos coloridos tomam o espaço branco ao redor, alguns mais grossos, mas ainda finos, outros tão, tão finos que quase não se vê. De repente, um dos finos capilares, do qual era difícil divisar a origem, ganha corpo e desponta bem marcado galgando o canto superior direito da tela. Ele é cheio de energia e paixão. Não recebe ordens e não leva desaforo para casa. Ignora tudo e todos ao redor e vai somente pela própria cabeça. Está vermelho de ódio e vermelho de dor, amor e tudo o mais que rima e termina em or, como calor, estupor, fedor, horror, vigor e por aí vai. Desse canal de tinta vermelho e sanguíneo, ainda correm alguns traçados laterais de cores vivas. Todas as cores se cruzam e bagunçam o meio da pintura que, no mais, poderia ter sido uma dança moderna no lugar de uma narrativa sem sentido. Não é possível seguir um só traço até o seu derradeiro fim.

Acompanhamos a Vermelha até o momento em que todas as cores do mundo, representadas, na minha pintura, por todas as tintas que eu possuo, desabrocham dando um último suspiro angustiado de sua ponta que, após encontrar a tal borda superior direita da tela, se volta para a diagonal oposta e começa um caminho descendente.

Contudo, sem que ninguém tivesse se dado conta, a despeito de todos os intensos protestos da pintora e se expressando quase que por meio de um sussurro, do meio das cores vivas que despontavam como raios da mancha vermelha se insinuava um fio marrom que se avoluma horrendamente conforme o traçado retorna a sua origem.

Marron segue fingindo segurança de si, firme, numa jornada de ponta cabeça em queda livre pelo meio da tela. Ele acha que volta para onde veio, mas ninguém sabe onde ele vai parar, mas ele finge saber e acreditar que está indo para onde decide ir. Todos os brilhantes fiozinhos de tinta coloridos que dominavam o restante do quadro foram arrancados por Marrom pela raiz. Alguns cotocos permanecem para contar a história do que Marrom poderia ter sido, mas Marrom tem muito medo de ser qualquer outra coisa além daquilo que se acostumou a ser por mero acaso. Se fosse outro o quadro, talvez Marrom ainda pudesse ter se tornado Verde, Rosa, Preto ou Laranja, mas neste quadro Marrom vai morrer Marrom.>>>

 

Talvez eu intitulasse o quadro de O CAMINHO.