Impotência (não do tipo que você está pensando).

Eu estou em um pedestal feito de açúcar. E um milhão de pequeninas formigas se aproximam e começam a comer este açúcar. E eu grito lá de cima desesperada: “Vão embora formigas! Vão embora”!. Mas é inútil. Elas continuam chegando.
É como se eu estivesse sentada em um trono de gelo debaixo do sol de verão. E eu fico gritando: “Vai embora sol! Vai embora!”. Mas meio dia se aproxima e o sol brilha cada vez mais alto no céu.
Eu me olho em casa no espelho e saio nua no carnaval. Mas estou mais feia do que a peste e os homens passam longe de mim.
É como se eu tivesse feito faxina na casa, mas o meu próprio corpo soltasse sujeira.
São todos poderes mais fortes e mais esmagadoras do que eu. Eu grito: “Me dêem amor! Olhem como eu sou bonita! Eu acabei de tomar banho, essa podridão não vai descer pelo ralo?”.
Defeitos incorrigíveis. E eu orgulhosa por um instante. Até o espelho da vida se colocar diante de mim e me mostrar o meu lugar. Até o dedo divino apontar aquilo que eu estou escondendo debaixo do tapete, mas que, a despeito dos meus maiores esforços, deixa o rabo de fora. Eu ajoelho no chão, chorando, e empurro tudo para fora, mas numa lufada de vento que mais parece um furacão, volta tudo para dentro de casa e para dentro de mim com uma força cortante. Eu tento proteger os olhos pelo menos, mas não adianta, nada adianta. Entre pelo nariz, pela boca, pelas orelhas, pela pele.
Eu fico parada, imóvel, me fingindo de morta. Mas é um urubu que me persegue. Quando eu acho que o engano, na verdade lhe sirvo um banquete.
E a dor acaba, e a felicidade acaba, a vida acaba. Agora sim não sobrou nada. Os ossos jogados pelos cantos, um fêmur deve ter voado pela janela, não tem importância. Só deixe os que sobraram por aí. Eu só espero que eles não se sintam tristes e sozinhos separados das carnes e do pensamento que antes eles sustentaram com tanta luta, mas agora já não há o que fazer mesmo. Só resta seguir em frente. O trabalho de decomposição só acaba no pó. Será que então eu vou conseguir voar até o céu? Ou vou acabar numa caixa de gato grudadinha no cocô?