Creme ou doce de leite?

Tive uma discussão séria com meu marido hoje.
Eu fui ao mercado de noite para comprar as coisas da janta e ele me pediu para comprar dois mini-sonhos para ele de sobremesa. Um de doce de leite, o sabor do outro eu poderia escolher para surpreendê-lo.
Eu comprei um de doce de leite e outro de creme.
Quando ele viu o sabor do segundo exclamou: creme?! Quem gosta de creme?! Começou a discussão. Eu respondi que creme era o melhor sabor do mundo! E ele ficou insistindo que não, que o de doce de leite era melhor e que ninguém gostava do de creme.
Mas que absurdo!
Lembrei da época em que éramos pequenos lá em Jardim América. O padeiro passava na Rua 16 pela manhã e no fim da tarde. Quando ele vinha de noite, todas as crianças se juntavam ao redor, porque ele dava os doces que haviam sobrado de graça para nós. Era uma festa! Segundo o meu marido, todos brigavam pelo sonho de doce de leite. Eu já não tenho tanta certeza de que era assim não. Eu me lembro de ter que disputar sempre pelo sonhos de creme. Nós comíamos tudo ali na rua mesmo, sentados nos portões das casas, com as últimas luzes no horizonte, trocando selinhos por mais um pedaço do sonho do colega, falando sobre as preocupações que nos assolavam na época, rindo também, entre um assunto sério e outro. Era tudo doce. Os sonhos, os beijos, os risos, os choros. Mas antes que eu me deixe levar mais ainda pela poesia dos fins de tarde do bairro da minha avó, vamos voltar à questão.
Meu marido sugeriu por fim, para que pudéssemos sanar essa dúvida de uma vez por todas, que eu fizesse uma enquete: qual sabor de sonho vocês preferem: creme ou doce de leite?

“Por onde andam meus pés”? Dia 6.

Quando eu fico dois dias seguidos ou mais na casa da minha avó, eu não resisto. Eu começo a aproveitar o bairro.
Atrações turísticas? Várias barraquinhas de açaí, a pizzaria que tem a melhor pizza do mundo, que é uma meio a meio de atum com banana, a praça da Igreja (que vocês conheceram ontem) e o hambúrguer que me introduziu no mundo do fast food.
Claro que eu não subo mais no trepa-trepa constantemente (ainda que, com dois primos pequenos, eu já tenha feito isso com mais frequência do que o esperado de outras pessoas da minha idade, que são zero vezes), mas essa foto não é tão artificial assim. Deve ter, no máximo dois anos a última vez que eu brinquei nesse negócio.
Sinceramente, esses parques que os adultos podem ir não estão com nada. A gente paga caro para ficar dois minutos no brinquedo, não faz atividade física nenhuma, corre o risco de morrer e vomita no final! Bom mesmo é balanço, escorrega, gangorra e trepa-trepa. Eu só vou no parquinho quando não tem criança nenhuma lá. Então, não me critiquem por ficar ainda sentada num balanço sempre que posso.
Eu vejo menos crianças nos parquinhos do que eu costumava ver antigamente. Me parece que tem menos crianças brincando na rua. Outros adultos têm a mesma impressão que eu. Ficar mais velho é sempre assim mesmo, não é? Começar a achar automaticamente, sem nenhum tipo de reflexão crítica, que na nossa época tudo era diferente e melhor.
Se você conversar com os ex-adolescentes que ficavam comigo na rua naqueles dias, eles vão te dizer que a gente deu sorte, que na nossa época ainda dava para ficar na rua, hoje em dia não mais, porque está tudo muito perigoso. O caso é que, quando eu saía para a rua, minha mãe ficava muito preocupada, porque estava tudo muito perigoso, já era um pouco perigoso na época dela, mas dava para levar. Minha avó já vai te dizer que o medo maior na época dela era com a honra, não tinha essas coisas de violência. Os nossos filhos vão proibir os filhos deles de sair de casa por causa do aumento da violência ou de outro perigo qualquer.
Você deve estar pensando: “mas a violência aumentou mesmo”. Olha só, ou a gente está caminhando para uma distopia bizarra, ou você está apenas sendo enganado pelo truque que engana todo mundo. O de achar que tudo era melhor na nossa época.
Eu também acho que era tudo melhor na minha época! Claro! Apesar das gerações que vieram antes de mim afirmarem que boa mesmo era a época deles, eu acho que a minha é que é a melhor de todas.
O problema é que o ser humano é um bicho que tem propensões estúpidas: ele tem medo do desconhecido e se apega excessivamente ao que conhece. Está aí toda a falha da educação das crianças.
Nós criamos as crianças em um mundo novo, que não é aquele em que nós vivemos. Esse mundo novo é cheio de perigos e armadilhas novas que nós não experimentamos. Não temos as ferramentas necessárias para combater esses novos perigos. Então imbuímos nossos filhos com a única coisa que temos para protegê-los: medo. E é essa herança que eles vão passar adiante.
Quanto a nos apegarmos excessivamente ao que conhecemos, isso se reflete no fato de ser muito difícil para os pais verem os filhos desenvolverem hábitos novos, que a geração deles não tinha, se comportarem de modo diferente, de um jeito que os incomoda e que eles chamam errado e não saudável. Os pais se incomodam, e brigam, e castigam seus filhos porque eles desviam do modo como os pais foram criados.
Existem aqueles pais que fazem questão de não passarem a educação que receberam, é verdade, geralmente por esta ter sido excessivamente rígida. Esses pais também são excessivamente apegados ao que lhes é familiar e vão pecar com seus filhos também. A diferença é que aqui a familiaridade é com o que esses país cozinharam na cabeça deles como forma de educação adequada. Eles se apegaram a uma idéia de educação e é essa idéia familiar que eles lutam para por em prática.
É muito difícil para os pais verem seus filhos se tornarem pessoas novas, independentes e, principalmente, diferentes deles, do que eles viveram quando eram pequenos ou do que queriam ter vivido.
É nesse turbilhão e nessa batalha de emoções que nós crescemos. Não é de se espantar que percamos algumas noites de sono pelo caminho.
Dizer isso não significa que eu não vou fazer besteira se um dia resolver ter filhos. Quer dizer apenas que, hoje em dia, eu adoto a postura política de respeitar a época das crianças.
Você gostava que os adultos falassem mal o tempo todo do mundo em que você vivia? Dizendo que bom mesmo era um mundo que tinha acabado e que você nunca iria conhecer? Isso era desolador. Um desrespeito com as crianças.
O melhor que você pode fazer hoje é pedir que as crianças te contem como está o mundo atualmente, elas sabem melhor do que você. Elas serão os adultos que vão educar os filhos amanhã com base no que vêem hoje. No lugar de tentar fazer ela engolir a sua visão – Você sabe que ela não vai engolir, não é? Você não desenvolveu a sua visão de mundo particular, diferente daquela dos seus pais? Elas também irão – pergunte qual é a visão de mundo dela. Escute para depois saber como orientar. Saiba quem é aquela pessoa, para que depois você possa tentar ajudá-la a atingir o potencial dela.
A despeito das suas ternas memórias da infância, todos os mundos, daqui para frente e daqui para trás, foram tão bonitos e felizes para as crianças que eles abrigaram quanto o seu foi para você. Aprenda a respeitar isso.

“Por onde andam meus pés”? Dia 4.

Contei para vocês a sensação das pedrinhas do quintal da minha avó sob os meus pés descalços. Agora vocês estão apresentados.
O chão estava quente naquela hora que eu tirei a foto. O calor, as pedrinhas e o Natal.
Foi para a casa da minha avó que meus pés me trouxeram hoje (com a ajuda dos pneus do carro da minha mãe, porque é bem longe).
Todos os anos nós passamos o Natal aqui. Assim como todos os domingos de todos os anos. Esta família se reúne sempre.
Eu sei que existem famílias que esperam o Natal para se reunir e brigar, a gente faz isso periodicamente. Toda semana nós nos reunimos, comemos, rimos e brigamos. No Natal só muda a hora. No lugar de ser no almoço é na janta.
O dia é corrido, passado inteirinho dentro da cozinha: maionese, farofa, várias farofas diferentes, arroz, macarrão, rabanada, carnes, várias carnes diferentes também. O dia inteiro de forno e fogo ligados. Muito calor.
Aqui é muito, muito quente. Tão quente que um ventilador de teto na cozinha não dá jeito.
Hoje, lá pelas quatro, começou a chover, só que não deu nem tempo de dar graças a Deus antes de faltar luz. O ventilador de teto parou e o calor nem tchum. A chuva não refrescou a casa. Me fale de apreciar as pequenas coisas! Uma brisa fresquinha fazia todos pararem e suspirarem.
Nesse clima, cozinhar foi um suplício ainda maior.
Comer a rabanada com café no fim da tarde foi um suplício.
Eu estou tentando escrever e está difícil de me concentrar sentindo as gotas de suor escorrendo da dobra do joelho… da dobra do braço… na testa… nas costas.
Eu fiz uma pausa na escrita do texto para tomar banho e mesmo depois do banho continua quente.
Hoje eu derramei açúcar em cima de mim e foi muito difícil de limpar porque ele meio que derreteu no meu colo suado. Eu tive que ir lá fora no tanque tomar um semi-banho de torneira.
Eu tenho uma lembrança de tomar banho de tanque lá fora quando eu era pequena. Era de noite e a luz da área estava acesa… A iluminação era relaxante. E, naquela época, já fazia calor aqui, então um banho lá fora era o paraíso.
Tem o chuveirão também, lá no quintal, mas com a idade parece que vai ficando mais difícil simplesmente ir lá, e se molhar, e secar ao relento sentada no portão conversando com os amigos como eu fazia antes. Não. Conforme o tempo vai passando eu fico cada vez mais tempo aqui dentro ajudando a cozinhar.
Está muito calor aqui. Mas daqui a pouco todo mundo vai chegar da missa de qualquer jeito, todo mundo vai comer a comida quente de qualquer jeito e vai se abraçar também para desejar feliz Natal. Aqui a gente ignora quando alguém diz: não me abraça não que eu tô suado! Se fosse assim ninguém se tocava.
Está muito calor aqui e mesmo assim eu vou voltar ano que vem e domingo que vem.
As tradições funcionam assim: sempre tem um desconforto, mas alguma coisa compensa o sofrimento. Por mais que você olhe de soslaio para as mensagens clichés, por mais que você xingue todo mundo quando você está no shopping cheio comprando presentes que você não tem dinheiro para pagar, quando você está derretendo na cozinha…
E aí? O que é que tem no Natal e nas tradições de um modo geral?
Tem a sensação das pedras debaixo dos pés descalços: o gosto da infância que já não tem mais tanto glamour assim, mas que, por algum motivo, você não consegue abandonar.
Você não larga disso tudo porque você sabe, lá no fundo, que não tem muito para onde correr.

15 perguntas para lidar com situações difíceis.

Tenho me interessado muito por escrita terapêutica.

Escrever pode ser um ato curador, além de ser algo muito prazeroso. Devo falar ainda muitas vezes sobre isso no futuro, pois tem sido um dos meus mais queridos temas de estudo.

Já falei aqui sobre journal therapy. O que eu quero compartilhar com vocês hoje são algumas perguntas, que funcionam como guias para a escrita de si, com o objetivo de trabalhar eventos traumáticos.

É importante, ressaltar, claro, que a escrita de si não substitui acompanhamento psicológico ou medicação. Trata-se apenas de uma forma alternativa de buscar autoconhecimento e alívio do sofrimento.

 

Procure um lugar calmo para se sentar com um caderno. Certifique-se de que você terá um tempo razoável para pensar e escrever sobre as suas experiências.

Se nada disso for possível, ou se você for interrompido, não fique alarmada! Apenas retorne à atividade em uma hora melhor.

 

Pense e escreva sobre as suas experiências passadas a partir das seguintes perguntas:

 

1-      Quem é você atualmente?

2-      Qual é a sua história favorita da infância?

3-      O que você aprendeu de bom com ela?

4-      Esses aprendizados positivos ainda te acompanham?

5-      Alguma coisa no seu passado já te causou dor ou sofrimento? Fale sobre essa experiência.

6-      O que você teve que aprender ou fazer para lidar com este sofrimento?

7-      O que você aprendeu e os comportamentos que você desenvolveu foram positivos ou negativos?

8-      Você ainda emprega estas estratégias em momentos adversos do presente?

9-      Estas estratégias ainda são úteis para você?

10-    O que é curador para você depois do sofrimento?

11-    Se a pessoa que você mais ama neste mundo passasse pela mesma situação que você passou, o que você diria a ela?

12-    Qual é a sua maior força depois de ter passado pelo sofrimento que você passou?

13-    Como o sofrimento que você experimentou contribuiu para o seu propósito de vida?

14-    Quem é você enquanto um ser humano completo e saudável, com experiências negativas e positivas em seu passado?

15-    Se você tivesse que resumir em uma frase a lição mais importante que você tem a deixar para o mundo e para aqueles que você ama, qual seria esta frase? Invente ou se aproprie de alguma citação que passe a mensagem que você gostaria de passar.

 

Sintam-se à vontade para compartilhar histórias comigo. Qualquer dia eu mesma posto as minhas respostas.