Erotomania 

A Erotomania ou Síndrome de Clérambault é a convicção delirante de um indivíduo de que uma outra pessoa está apaixonada por ele.
O transtorno é tema do filme “Bem me quer, mal me quer” que narra a história de uma personagem encenada por Audrey Tautou, Agélique, em sua relação amorosa com Loïc, interpretado por Samuel Le Bihan, como a direção de Laetita Colombani.
A internet está cheia de análises detalhadas do filme do ponto de vista da psicanálise lacaniana (são interpretações carregadas daquele machismo psicanalítico. Eu até tenho curiosidade de estudar a “psicanálise feminista”, mas até lá, o machismo no discurso psicanalítico me enerva. Esse é o caso dos comentários psicanalíticos sobre o filme: todos falam absurdos da psicologia da mulher e da sua posição no amor). Sendo assim, o que me interessa no filme não é a análise psicológica ou psicopatológica, mas os próprios elementos da narração da história. A maneira como o filme é construído.
A construção é genial no sentido de que ela nos faz experimentar a percepção delirante da personagem de maneira absolutamente realista. É apenas em um segundo momento que um jogo de câmeras desvela “o que estava realmente acontecendo”.
Quando ocorre essa virada da narrativa é que percebemos como aquela mulher estava “maluca”.
O fato é que, na vida real, não existe esse jogo de câmeras e estamos todos confinados, condenados à nossa percepção dos acontecimentos assim como a personagem do filme.
A loucura sempre parece essa coisa estranha e distante de nós, mas isso é uma ilusão. Todos nós, loucos e “sãos”, temos os dois pés na loucura. Alguns de nós estão socialmente bem adaptados e outros não. Só isso.
A Erotomania evidencia o fato de que amar alguém é uma loucura. Você se entrega de corpo e alma e começa a confiar em uma pessoa estranha que você conheceu em algum momento da sua vida, você passa a conviver com essa pessoa, conta para ela os seus segredos, baixa a guarda; insiste na relação ainda que, muitas vezes, ela nem seja pacífica. Os casais sofrem, brigam, terminam, voltam a ficar juntos. A gente se apaixona a primeira vista. A gente gosta de umas pessoas e não de outras. A gente ama sem ser correspondido. Mulheres são estupradas, a violência doméstica é alarmante. A gente tem o nosso coração partido. E mesmo assim nós continuamos amando e sentindo essa necessidade sempre premente de amar e ser amado. Se a gente queima a mão no fogo uma vez, a gente não põe a mão lá novamente. No amor essas regras não se aplicam. Toda a nossa lógica voa pelos ares. A gente decide que não vai se apaixonar, que vai passar um tempo sozinho e aí aparece aquela pessoa que faz nossa cabeça girar e de repente, a gente quer estar junto e não mais sozinho. A gente passa horas se perguntando o que ele quis dizer com aquilo sem chegar a conclusão nenhuma, a gente não entende por que ele não ligou ou por que ela me traiu. (Estou trocando o gênero das frases porque todas essas preocupações valem para os dois sexos. Em se tratando de amor, está todo mundo no mesmo barco).
Amar alguém é a coisa mais louca que se pode fazer nessa vida.
E, na vida real, não tem o outro lado da história. Não tem a segunda versão dos fatos. Cada um de nós fica encerrado em sua própria loucura, julgando a loucura alheia.